A vida escorre hesitante em
dias de dor dentro do peito
É cair a tarde, vem o crepúsculo
e, com ele, frio e solidão
Na memória dos
folguedos de criança de antigos verões
Ainda lembro da propaganda elegante de sapato na tevê
Recordo também
do seriado de ficção proibido pra mim
Tocava uma música tão tensa
como as cordas das harpas
Enquanto lânguidas sombras
gravavam a alma de silêncio
Cortejo a chegada das últimas horas do dia que se retira
Com saudades das bocas vermelhas e sorrisos de alecrim
Do palácio luxuoso que o rei
prometeu, das naus à deriva
À noite, aparenta que a cidade
se encolhe por todo lugar
O perfume das flores se faz
oxidado num verão tão pobre
Pobre de sonhos e romance
enquanto a neblina se alastra
Num ardiloso ato na derradeira
esquina de uma vida vazia
Para ir calar o vozerio febril das
ruas de forma insinuante
O que era um lençol de paz e
calma na tarde, é um arrepio
Como nas alucinações
vespertinas, sob o céu avermelhado
Que ouve
vozes ditando presságios nos rumores dos ventos
E o aroma doce de gim se espalha em uma gargalhada ébria
De súbito
tocarão os sinos, sabes tu por quem eles dobram?
Há tempos
que o sol despe da pedra sua couraça de musgo
A chuva se
filtra nos veios da pedra e irá formar novos rios
Tal aquela
criança que, pé descalço, irá reinventar o mundo
Noutro
dia haveria de gritar inconformado, hoje se resignou
Cada qual deve suportar sua
sina, digo ao amigo que se vai
Não flor, morrer não é como
hibernar e em breve o saberás
Há um céu
sem estrelas que nos faz estar como numa caixa
De teto preto, que em outros
tempos se via uma claraboia
De onde se
podia olhar o mar e, sob a luz da lua, até sonhar
Tal tempo se foi, e nós aflitos e perplexos, só observamos
Ao amigo Paulo Della Rosa
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