quarta-feira, outubro 16

Vidraças



Desconheço porque alguns dias se fazem tão ermos e cinzas
O cansaço é mais que escuro, é negro, assombra nossa mente
Ao longe, a risada das moças de cintura fina ecoa na calçada
Há uma dor alarmante no peito, um aperto duro ao cotidiano
Como se caminhasse entre penhascos de subidas torturantes
Sente-se algumas agulhadas pelo corpo, como neurônios frios
Não há feridas abertas e a vida flui, porém, está lá a cicatriz
Velha chaga que não é mais gritante no seu antigo gigantismo
Contudo, ainda estende sua circunferência além da periferia

Ficou em um passado quase olvidado, aquele guerreiro inglório
Que retornava ferido, meio indigente, de batalhas sangrentas
Com a cabeça pendente, vertendo lágrimas por tantas perdas
Sem lugar onde repousar, sem palavras de alento e sem futuro
Em vitórias em que vencer não constituía estar ao menos feliz
Mas houve tua chegada e nova batalha é travada: pelo tempo
Tão exíguo, tão importante; por minutos árduos de conquistar
Cada segundo recria em si a pétala de uma flor, perfume e cor
Deixando-me, no corpo sem ar, um turbilhão em meu coração

Preciso te dizer que esse amor tão breve, também é tão denso
Que todo meu ser te busca, a cada espera, a romper o silêncio
Com a alma desnudada, os olhos inundados, sorriso de criança
Desejando quebrar as vidraças de todos teus receios de amar
Ai estás, face ao poema, sinto tua pulsação rápida, mas saibas
Sou teu guardião, aquele que curaste todas as feridas e dores
Que elevaste meus olhos além do horizonte breve da angústia
Que jamais vai te ferir e sim zelar. Contigo para rir ou chorar
De dia te cuidar, à noite seduzir; te fazer minha como sou teu

Havia um vazio, um abismo insano no qual só o nada germinava
A brisa soprou afetuosa, devolvendo-me todos verbos do poema

 

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