terça-feira, maio 5

Noturno 6.0

As estórias de meu universo se multiplicam com a chegada da noite

Nessas horas que o azul celeste se permitiu transmutar em marinho

E o luar trespassa o véu que cobre a terra de infinitos pontos de luz

O sereno noturno é o elixir para o poeta, é o linimento para sua alma

O que me é real, se inicia com os sonhos e vãos gestos volatilizados

 

Na quietude noturna as palavras represadas pelo dia, se profundem

Dando a exata medida ao poeta qual as asas dão medida ao pássaro

Contemplo as pessoas à minha volta a renderem-se ao recolhimento

Enquanto que para alguns o avanço das trevas irá induzi-los ao sono

É dentro de mim ígnea combustão a sacudir todas memórias da vida

 

Com a noite as cores se calam e os cinzas se desdobram soberanos

Eu, fruo das linearidades fugazes dos tantos contrastes aplainados

Para deitar ao papel versos, quais sentimentos na ponta dos dedos

Que são tal as ausências ou o carinho olvidado neste tempo de dor

Pela remota ficção dos amores negados e sentimentos dilacerados

 

Minhas lembranças me vêm como uma tormenta multicor e lúcida

São imagens que orbitam pelas voltas de meu cérebro em vertigem

As ideias fluem, percebo que antigos coros são hoje vozes mortas

E de tudo que já foi restaram apenas suspiros, aflições revisitadas

Onde ficaram os folguedos infantis, tempo sem dor, sorrisos largos

 

Afasto todos pensamentos tristes que poderiam mastigar minh’alma

Reconstruo aqueles campanários das saudosas manhãs de domingo

Reabro as janelas ao mundo que corre lá fora, me volto ao horizonte

A noite flui e gravo minhas percepções ao longo de escuros minutos

E a palavra se inscreve neste instante entre instantes tanto inglórios

 

E toda noite refarei o verbo, indispensável, gritante, caleidoscópico.

Porque? Por que assim é necessário, insuplantável, refazer a energia

O impulso de vida é feito de desejos irrefletidos, de árvores floridas

Eu, cansado de flutuar sobre abismos, embarco na brisa antemanhã

O sonho é realidade ao alcance de um braço, na esquina do infinito

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