quarta-feira, maio 30

Querer


Nos vagos olhos que só os da morte reúne, há toda dor que cabe
Neles estão todas as lágrimas do mundo, está meu sereno eterno
Recordo mil encantos que flutuam pelos ventos à boca da noite
Levados pelas nuvens açoitadas por anseios que aguardo vingar
Desejo beijar sua boca, qual desejo é como o barco deseja o cais
Mas as marés, inscientes do querer atropelam a rota e é só o frio
Só distância nestes eternos tempos da ausência e incompreensão
Penso em seus seios, tal o murmúrio das águas cristalinas do rio
Que traz minha petulância movida pela gula e não pela carência
Mas silencio o verbo se tomado de culpa nos becos da inquisição
A madrugada oculta as estrelas como os segredos em suas coxas
E os reinventei até virem revelar-se, despudoradamente, úmidos
Meu paraíso e fruto proibido, meu verso liberto de receios vãos
Aquele que é apenas uma gota do que outrora já foi um temporal
E aguarda ansioso para se tornar o oceano e jamais subjugar-se
O que é areia, já foi tempestade, ora aguarda a rosa lhe faça raiz
No meu sonho, escalas meu peito como o eremita escala a rocha
Nele faz ninho sem mitos ou medos, entre o meu e teu horizonte
Lá onde o nosso silêncio seja uma prece que não precisa ser dita
Perdoe-me se não sou o que cala, sou antes um grito vivo e hirto
Sempre de peito aberto, de nudez enérgica, de eficiência poética
Não hás de me querer sem som ou sem cor entre unhas e lençóis
Posso ser o que abominas, mas não sou aquele que te vai mentir
Ocultar dentro da crisálida. Não sou o que não sou nem o que és
Sou muito mais do que digo ou faço, nem a vítima, nem o algoz.

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