terça-feira, novembro 12

O Segredo da Lua

A tarde é um céu opaco na tristeza do entardecer
Impera um propício silêncio a preceder o temporal
Com o pensamento que germina em todas solidões
Minha voz nutre-se do alento, na memória do rosal
No tempo insone que separa a folha receber a flor
Nas voltas decompostas do relógio em turvas horas
A peculiar atmosfera enquanto se aguarda a chuva
As ideias me desertam na espera que a tarde impôs
A crueldade do calendário de saber tantos ontens
Mas a fugidia incerteza de que será algum amanhã
As nuvens, num esgar colérico, troam relâmpagos
Indiferente o ancião bafora seu corroto cachimbo
Cotovelos fincados na janela do outro lado da rua
Sob esfera celeste tão gris algo desgoverna em mim
Como poderia diante dessa tão refinada paisagem
Não sentir falta em assoladora e remota ausência
Não, não queria e nem vou dizer nada dessa falta
Porém nessa ardente flora que nasce da ausência
Não colherei flor alguma. A lua e seu porte grácil
Espalha sua luz pelo céu que as nuvens segredam


sexta-feira, novembro 8

Tuas Letras

Quando o inverno já apontava na instabilidade dos meus dias
Tu entraste em minha vida qual a neve no alto da cordilheira
Por mais que me recusasse, tu brilhaste em mim como um sol
Eu que era crepúsculo, minhas pétreas premissas desabaram
Quando me beijaste nos lábios ao vento noturno à beira-mar
A imagem de teus cabelos esvoaçantes não me sai da cabeça
Tuas carícias, qual fugidio vinho, percorrem minhas artérias
Sob a lua das ilusões minha voz recita versos até o alvorecer
E eu, vítima de teu feitiço, perdi-me no sonho de tua vinda
Teu incandescente beijo carmim que me fez ébrio de desejo
E desnorteia o coração que em meu peito palpita acelerado
Com tua pele de luz resplandecente a iluminar meu caminho
Chama incessante, assim viajo pelas dimensões de teu olhar
Minhas noites cintilam por ti e os astros e estrelas são tuas
Galáxias inteiras ou um único vagalume perdido, é só por ti
Este poema também é teu, afinal, és tu a razão destas letras

quinta-feira, novembro 7

Desafio

É tão fugaz e esquivo dar vida ao mistério das palavras
As poesias desde sempre entranhadas em meu coração
Mas nem assim me pertencem, assumo, mas me habitam
Numa vida que tive tanto que andar e de me desgarrar
Inquieto-me em poder dar ao bronze formas e essência
Súbito descubro que ao festim foi convidada a solidão
Faço com que a melancolia seja nada mais que desafio
Prosseguir jogando o jogo entre todas as minhas idades
Onde os pássaros cavalgam os ventos, acima das ondas
Abrir a janela, aspirar o campo, o cheiro de terra úmida
E recordar da brisa que se entremeia entre os arbustos
Mesmo quando dói trilhar pelo caminho da maturidade
Esquivando-se dos ritos, consultando signos e oráculos
Recorda hoje as vozes de outrora baterem à tua porta
Relembra da esperança amanhã, porque nunca foi fácil
Pois aqui estou como menino a cantar velhas canções
A sorver o novo poema, tal quem sorve a taça de vinho
O novo poema mais lúcido de um implacável anoitecer