quinta-feira, agosto 16

À Deriva


Foi por essas noites tão sombrias, ao vento, silêncio infinito
Pensei nas cicatrizes que deixou o passado e quantas deixei
Nesse desalento caótico, lamento as feridas ainda expostas
De todas ilusões que se perderam na incógnita ou no olvido
Pressupõe-se que nossos passos já não mais deixem pegadas
Na pedra de sacrifícios, a busca do divino revela o profano
Desse jeito torto de ser nascem poemas tanto tormentosos
Só por ser capaz de crer no amor por razões além da razão
Pois na lágrima que desce a face não estão todas respostas
O querer não pode ser inócuo ou frio. Precisa ser emoção
Não mero vício, um desejo vão de não estar fisicamente só
Ou o que se chama fé, assemelha a uma descrença infinita
Como nau à deriva que, há tanto tempo, se perdeu do cais

Parado diante do horizonte, por vezes assim eu me indago
Para aonde vais para querer cruzar águas tão tormentosas
Porque pranteias dessa dor amarga que parece não ter fim
O vento sopra morno lá da serra como alento aos errantes
Com o olhar perdido, em descompasso, numa luta desigual
Assim navego ao sul nesse mar de lágrimas duras e imensas
O sonho é bom, nele a esperança se farta de coragem viva
Mas a realidade é cruel e desleal e a esperança só miragem
Deixo o cais para que o destino realize desejos improváveis
Parto, mas sem levar na boca o gosto amargo da despedida
Nunca mais serei tronco, imóvel, onde se amarra os barcos
Nem serei a pessoa a qual o carinho deu lugar à indiferença
Cuja pele se esqueceu do toque e que acredita que o amor
Seja só uma palavra escrita num livro velho que ninguém lê

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