É novamente madrugada e o frio
invernal desce das montanhas
Meu corpo estremece, mas nem é
pelos rigores da temperatura
É pela
falta de alento, é a esperança que já agonizou há tempos
Pela alma pendurada infinita nessas
insônias que me assombram
Apesar dos enganos eu pude
conservar a capacidade de sonhar
Arduamente
repaginando milhares de constelações de quimeras
O existir não traz o mapa, não
esse de tantas tentativas falidas
Não diz como alcançar o cume antes que só restem os vestígios
Mas ainda assim, sorrio ao recordar
das tolas paixões de chuva
Até o tempo que nunca se comportou diante das tempestades
Cala na falta de rima destes versos cheios de curvas e
ladeiras
Invenção que alguém deixou traçada nas nervuras dos lençóis
A lua chega de um rompante como
uma deusa de prata e ilusão
Cá em baixo, nas esquinas, as
flores de plástico desbotam nuas
Sem perfume, revivem apenas pela
graça de uma alma dadivosa
Enquanto suplicam por alforria,
na noite toca um adágio lento
Há dentro de mim germens de
poemas que invocam por nascer
Ora feitos de retratos das mais
singelas passagens de uma vida
Minh’alma punge quando se rememora
do som dos cata-ventos
Do sino da igreja afastada, do
alvoroço das crianças na praça
Ora como o vento bravio que
dilacera o peito nas lembranças
De gritos tão remotos que
chegam em negrito e em caixa alta
E tudo se mistura, as palavras
incendeiam como lança-chamas
Para gravar sua dor coberta de
musgo nas pedras do caminho
Levanto-me, espano levemente a
poeira do tempo de escrever
Olhos ao relógio, para saber a
hora e se sobrevivi ao vendaval
Agora que o pulsar frenético
das vozes noturnas vai calando
Sigo noite adentro delineando
teu olhar profundo e distante
Nos passos ébrios destes
versos, no ventre severo das palavras
Ponho ponto no fim da linha para que não seja apenas
saudade.
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