segunda-feira, junho 26

Tragédia

Porque torno a te escrever se teus olhos verdes não irão ler

Pois não se trata de escrever o que fomos tu e eu, certo dia

Fosse pela tragédia de alguém que contasse alguma história

Mas sou eu o que amanhece de olhos úmidos a cada manhã

Como me pesa ter as asas úmidas, como me pesa esta pena

Minha tragédia, razão do abismo, foi não poder despedir-me

Não poder como a quem parte, desejar boa ventura, vá bem

Foi apenas um adeus caprichoso, mas que nem mais importa

 

Não se conhece o que há depois da morte, qual sorte d’alma

E depois que fechastes os olhos, ainda há cor? Ou há rumo?

Aqui a tragédia decora o quadro e a caminhada fica tortuosa

A lembrança é uma síntese vermelha, cravos sobre as águas

No papel manchas negras para ocultar essa dor sem sentido

E volta-se ao velho livro já lido uma e outra vez e mais vezes

Que mesmo assim vai murchando qual secam as flores rosas

Na paisagem crestada que, então, tem orlado minha estrada

 

Com remos de palavras venho remando entre ondas escuras

E as sombras podem se confundir com o alento e com flores

As flores que se alimentam de lágrimas, sem nunca ter nome

Dos nomes e nomes que eu disse depois e só chamei o vazio

Por vezes os poetas inventam palavras e as palavras mentem

Ouvi teu nome e não estavas quando a morte bateu à porta

A lembrança é a síntese de tudo, do olfato, do gosto, da pele

É também da tragédia, o dia seguinte que jamais se quis ver

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