Se escrever é fazer mágica, sou um mago; se for transformar, sou alquimista; se for dominar mistérios, então sou bruxo. Vim transmutar sentimentos em palavras e vice-versa. Os poemas falam de imagens, sentimentos e sonhos. Tudo se passa na vida real ou na surreal. Ao lê-los tenha atenção ao que está oculto nas entrelinhas. Deixe que os versos te levem onde o vento quiser levar. A musa de meus poemas é a vida. Estejam atentos, pois as palavras são metade de quem escreve e metade de quem lê.
terça-feira, junho 25
sábado, junho 15
Rastros
A história do existir tinge a vida sob o céu antes do amor
A vida tem nos segredos, pedaços de história não vividos
Tudo passa, as eclusas do tempo trazem o esquecimento
No brando oblívio das paixões que vão ficando para trás
O que se julgava a eternidade se tornará parcos minutos
Na esperança fugidia de sentir o sopro do verão no rosto
O perfume do jasmim, rastros de noites de brilho antigo
Bebemos o destino intransferível em seus cálices eternos
Na noite tal pátria luminosa do poeta no exílio do existir
Não há horizontes à vista apenas áridas estradas insones
Aqui restamos, coração abandonado, poemas indormidos
Pela madrugada adentro ao território de mais um amanhã
O passado é uma mancha de vinho sobre a toalha branca
terça-feira, junho 11
Onze
Era onze da noite o dia descansava de suas lutas
ferozesAs tolas mariposas voam em direção à luz onde morrerãoNem se atentam à gritaria dos grilos que as tentam
avisarO reflexo da lâmpada rabisca a água e a divide em partesOlho à direita e ouço o som do Tietê* que corre furiosoDe postura rebelde,
assim como eu, não peregrina ao marOuço seu rumor e lembro a árvore sob a qual te conheciRecordo tua pele alva,
os teus olhos vívidos e irrequietosEram música as tuas palavras e eloquência o teu
silêncioTua voz terna e mansa era um paradoxo à zanga aquosaEu trazia alguns poemas
nas mãos e tu quiseste ouvi-losE foi assim que me despi
a ti, jamais obsceno, nu de almaE na mais graciosa expressão, tua alma encontra a minhaFoi assim que descobrimos a existência d’outro
universoMas o tempo inexoravelmente a tudo irá furtar o brilhoEu fora recitar uns poemas no sarau dos Corvos poetas*Mas um golpe cruel me silencia a voz e o tempo congelaCom a notícia que algum poder atroz te roubou de nósSemeando a semente mais amarga no fundo da gargantaSilêncio e saudade é
que restou desses dias venturososNo relógio do saguão,
solidário a minha dor, marca onze
* leiam o comentário
Ser ou não ser
Falo a língua dos meus antepassadosA língua que não me
permite mentirOu negar o sangue que corre na veiaE sequer oferecer um gato por lebreSe eu duvido é para poder acreditarSejam as palavras a luz dos caminhosQue eu nunca diga nada que não seiDiante da janela quando a chuva caiQue nunca eu cante canções vaziasFalando do que não vivi ou não sentiMas nunca me cale diante do perigoE nem me ostente no dia de sucessoO meu verso não colha linha algumaSenão aquelas que eu mesmo semeeiQue eu não preste falso testemunhoMas o que eu vi com os olhos d’almaQue o coração não seja o que julgaNem a cabeça a que sente
a paixãoFalo a língua dos meus antepassadosQue de honra e
sacrifício se perfezDireto e sincero na verdade seja talO murmúrio da água
no leito do rio
segunda-feira, junho 10
Enamorado
Há muito tempo enamorei-me de mim, sem ser correspondido
Quando encontrei a mim mesmo, tornei-me inimigo do mundo
Encontrei a mim mesmo, encontrei a minha sombra e a poesia
Foi quando a noite amanheceu em mim, que entendi o tempo
Por entender o tempo descobri a noite e entendi a paciência
E foi a paciência que me mostrou que o poema deve maturar
Qual matura-se o mosto e é dele que vem o espírito do vinho
A matéria se compõe dos átomos e a poesia se faz das letras
Letras que formam palavras, palavras cada qual em seu ritmo
Palavras e ritmos com que construímos imagens reais ou não
Mas o poema resta mais que letras, palavras, ritmo e imagens
Algo tão maior que a nossa vã gramática nunca fará explicar
Tal qual a matéria humana suplanta o átomo
que a conforma
Preenchida de dor e espírito é bem mais que a física explica
Viver se faz de ilusões, alucinações no
vinho do desassossego
Fazendo da humanidade muito maior que
a forma que habita
Choramos face a guerras nefastas, tantas vidas naufragadas
Porém carecemos de bem escolher o escrito, diz Al-Kayyám:
Move-se a mão que escreve, e tendo
escrito, segue adiante
Nem todas as tuas lágrimas lavarão uma só de tuas palavras *
A poesia é o tonel de vinho sem fundo, o quê da esperança
A navegar pelas tormentas do tempo, nós, de alguma forma
Veremos nossas vidas naufragarem sem
chegar à terra firme
segunda-feira, junho 3
Caleidoscópio
Todas histórias cruzam-se pelos meus caminhos nesta dura
vida
E num olhar que só pertence a mim penso no nada, o
doce nada
Meu eu pássaro sobrevoa
sobre as nuvens na fronde das árvores
O chão esquálido é o sinal que o inverno chegou outra
vez mais
Deixo de lado a pena, sinto que sonho e realidade se
equilibram
As rotas pelo céu sejam quais andanças, não possuem
labirintos
Chega o entardecer acordando centenas de estrelas
orgulhosas
Orgulhosas, mas não como as vozes de filósofos, vindas
do leste
Esquecidas de seus donos, grassam entre ervas aflitas
de olvido
O fogo das conversas é
qual uma antiga oração que não queima
É o fardo dos profetas e de profecias
pobres de senso de humor
A escuridão voltou em memórias
rápidas e esquecimentos lentos
Entre as pequenas colinas toca
distante, um prelúdio de Chopin
Freixos e choupos do campo quedam
majestosos ao longo do rio
Que cicia palavras misteriosas em suas
fontes, refletidas no céu
Marcham pacientemente e atravessam a cidade em busca do mar
O gris celeste anuncia com
trovões, a vinda de nébulas coléricas
Não há ninguém nas janelas, cerradas desde as mais tenras horas
Como que envergonhadas das chuvas
que caem fora de estação
A chuva dissipa o balé de
andorinhas e sua poesia de movimento
Foi assim que me vi solitário frente
ao monstro opaco da cidade
Com seu hálito acre, suas rugas e cicatrizes, as dores reiteradas
Aqui rescende ao odor deste
inseparável tinteiro azul turquesa
Que ora serve para impedir que o
vento carregue meus escritos
Onde o poema colore o dia e o
pássaro, pousado, pode descansar
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