terça-feira, junho 11

Onze

Era onze da noite o dia descansava de suas lutas ferozes
As tolas mariposas voam em direção à luz onde morrerão
Nem se atentam à gritaria dos grilos que as tentam avisar
O reflexo da lâmpada rabisca a água e a divide em partes
Olho à direita e ouço o som do Tietê* que corre furioso
De postura rebelde, assim como eu, não peregrina ao mar
Ouço seu rumor e lembro a árvore sob a qual te conheci
Recordo tua pele alva, os teus olhos vívidos e irrequietos
Eram música as tuas palavras e eloquência o teu silêncio
Tua voz terna e mansa era um paradoxo à zanga aquosa
Eu trazia alguns poemas nas mãos e tu quiseste ouvi-los
E foi assim que me despi a ti, jamais obsceno, nu de alma
E na mais graciosa expressão, tua alma encontra a minha
Foi assim que descobrimos a existência d’outro universo
Mas o tempo inexoravelmente a tudo irá furtar o brilho
Eu fora recitar uns poemas no sarau dos Corvos poetas*
Mas um golpe cruel me silencia a voz e o tempo congela
Com a notícia que algum poder atroz te roubou de nós
Semeando a semente mais amarga no fundo da garganta
Silêncio e saudade é que restou desses dias venturosos
No relógio do saguão, solidário a minha dor, marca onze


* leiam o comentário


Um comentário:

  1. * Tietê: diz respeito ao rio Tietê que nasce em Salesópolis (SP - Brasil) e segue por cerca de 1100 km ao oeste, contra o sentido do mar, até desaguar no rio Paraná. Tem techos navegáveis e trechos bastante turbulentos.
    * "Corvos poetas" foi um grupo de poetas que conheci na cidade de Bueno Brandão (MG - Brasil) que se reunia para saraus em cafeterias, bares, pizzarias, todos vestidos de preto, para recitar poemas.

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