segunda-feira, junho 10

Enamorado

Há muito tempo enamorei-me de mim, sem ser correspondido
Quando encontrei a mim mesmo, tornei-me inimigo do mundo
Encontrei a mim mesmo, encontrei a minha sombra e a poesia
Foi quando a noite amanheceu em mim, que entendi o tempo
Por entender o tempo descobri a noite e entendi a paciência
E foi a paciência que me mostrou que o poema deve maturar
Qual matura-se o mosto e é dele que vem o espírito do vinho
 
A matéria se compõe dos átomos e a poesia se faz das letras
Letras que formam palavras, palavras cada qual em seu ritmo
Palavras e ritmos com que construímos imagens reais ou não
Mas o poema resta mais que letras, palavras, ritmo e imagens
Algo tão maior que a nossa vã gramática nunca fará explicar
Tal qual a matéria humana suplanta o átomo que a conforma
Preenchida de dor e espírito é bem mais que a física explica
 
Viver se faz de ilusões, alucinações no vinho do desassossego
Fazendo da humanidade muito maior que a forma que habita
Choramos face a guerras nefastas, tantas vidas naufragadas
Porém carecemos de bem escolher o escrito, diz Al-Kayyám:
Move-se a mão que escreve, e tendo escrito,  segue adiante
Nem todas as tuas lágrimas lavarão uma só de tuas palavras *
A poesia é o tonel de vinho sem fundo, o quê da esperança
 
A navegar pelas tormentas do tempo, nós, de alguma forma
Veremos nossas vidas naufragarem sem chegar à terra firme
 


Um comentário:

  1. (*) Ghiyath Al Din Abul Fateh Omar Ibn Ibrahim Al Khayyám (1048 - 1131)
    foi poeta, matemático e astrônomo persa, conhecido como Omar Khayyám

    ResponderExcluir