A Carta (O Barquinho Vai)
Tenho nas mãos
tua carta (e a surpresa que a tenhas escrito)
Olho-a
tristemente e lembro muitas histórias do meu passado
Sei que não
vês, que não sentes a emoção, nunca a sentistes
Devo confessar
que não a abri, tampouco não prometo abrir
Espero estejas
bem na tua ausência que nunca fora só física
Sei que o
inverno por fim chegou até ti e assim te faz sofrer
Mesmo não
desejando teu mal, todavia, isso não me importa
Como naqueles
dias importava, demais até, cada suspiro teu
Ah a paixão,
essa mania dos tolos e dos poetas (e sou ambos)
Olho para trás
e observo as dunas que se elevaram entre nós
Desérticas,
intransponíveis quais as tuas frívolas promessas
Eivadas de
palavras polidas na forma, quão vãs no conteúdo
É hora de
olvidar as aventuras, os sorrisos de cada chegada
Assim como
foram ao oblívio, as lágrimas de tantas partidas
O que afinal
poderias ter escrito que eu já não tenha te dito
E tenhas
solenemente ignorado ou, quando não, contrariado
Não vou negar
que há memórias inenarravelmente doloridas
Aquelas de nós
qual amantes, de nossos corpos extenuados
Mas as
sugestões dos amigos, te cegaram mudando os fatos
Para vê-los
qual quisestes: da pior forma que se o possa ver
Eis que à
carta que me destinas, cabe outro destino melhor
Seguir a
corrente que a chuva da tarde formou no meio fio
Em esmerada
dobradura à qual aceno o adeus que não deste
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