quarta-feira, outubro 23

Breve manual para amar de verdade


O murmúrio semântico num céu ocre nas tardes de tormenta
Vem tatuar indelevelmente com suas agulhas e tintas minerais
A face do ente amado ausente em nosso coração angustiado
Projeta-a nesse instante contra o gris d’um mundo ultrajante
 
Grava suas marcas, profundos estigmas na essência do existir
O amor vem a nós em conta gotas tentando inundar a solidão
Buscando o feito impossível de apagar a nota amarga da vida
A desconstruir as asas de chumbo e a longitude da distância

No mesmo ato que ordena negros ideogramas e anjos ocultos
O amor ordena a vida ao nosso redor, qual breves lagos de ar
Na clara pretensão de inventar rosas vermelhas sem espinhos
E o ambíguo conceito que podemos doá-las à mulher amada
 
 Quando a verdade se subjaz à crua conveniência do momento
Só o poema, recitado numa voz límpida mantém o equilíbrio
E a harmonia sem veladuras desmemoriais a alterar os fatos
Entregues aos trigais dourados pelo sol e ondulantes ao vento
 
Quando estia e a tarde recobra seu brilho, mínimos rumores
De um retorno tão esperado, vêm nos salvar desse cativeiro
Fazem a construção de uma música clara e aroma de jasmim
De curva sonora com ritmo de coração, sem outro pretexto
 
Concluímos que, de tudo, o que importa é vencer as chuvas
Um amor cotidiano e permanente, não só debaixo dos lençóis
Assim pode cantar o amor nudez conservando sua inocência
E nossas gargantas podem se declarar num sentimento maior

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