sábado, agosto 9

Como cantar




Como posso eu cantar
Se os pés da aflição me pisam o coração
Será que os sonhos estão mortos,
Caídos e abandonados na praça,
Perdidos num lamento duro como gelo,
Como um urro negro no meio da noite,
Crucificados nos postes do telégrafo.

Quando cai a noite, árvores, animais,
Todas as imagens caras da terra,
As fachadas de vazias casas iluminadas,
Doem em meu coração esterilizado pelas lágrimas.
Espero em vão neste círculo de inumanos
Que ao menos alguém grite no silêncio.

De todos os olhares que me cercam,
Nenhum deles em verdade me vê chorar.
Oculto meu peito dilacerado pela saudade
Junto com as lembranças de tudo que sou.
Percebo assim que sou seu e não mais me possuo
Apenas me guardo para teu querer.

Rasgo as noites em branco tentando te encontrar
Sem que meus pés se movam do lugar.
Onde estará meu coração que já não o sinto?
É que bate agora em outro peito
Não é mais solitário, outra vida o tomou,
Feliz, embora saudoso, esquecido de mim mesmo.

Me resta, nesses longos silêncios, como consolo,

Saber que só aos mortos não é permitido retornar.

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