sábado, agosto 9

Segredo da ausência

O segredo da ausência é essa presença disfarçada dentro de nós, é o apego com que tentamos segurar o outro para saber-se junto, além da fala e dos sons coloridos.

A figura que se vai pela porta de onde vem a fresta de luz matinal, leva consigo a sombra, mas fica o rastro de seu perfume e todos os demais múltiplos detalhes do que agora é apenas ausência.

O vago tom azul, reflexo do céu, que entra pela janela devolve o olhar profundo e solitário ao que busca em silêncio a contemplar as folhas frias sobre as quais se arrasta dolente a pena.

Minha visão do caos não se aclara, um pássaro agitado bate suas asas, traz a música da solidão ao pálido alimento que engole como um ácido de angústia.

O que turva minha visão é o manto da agonia a fluir do pensamento como um eco de espanto, restado da noite finda opaca nas memórias do prazer que a iluminava.

A casa ainda guarda os passos em sua face, guarda os sons de dois seres fundidos em uma só sensação como um caminho para a luz que leva a toda a plenitude.

Nem canto das aves me alegra as manhãs ou atinge a essência de querer quem deixou suas marcas espalhadas pelos objetos que lhe absorvem a falta e vão repousar no fundo do armário.

Na distância está o princípio que a essência de cada coisa revela, distinta ao olhar do filósofo, do geômetra ou do poeta, podendo ser uma fórmula estática ou uma forma com pulsação e consciência.

Tua falta é viva, traz no seu âmago uma dor que me faz resistir aos apelos fortes da noite trazendo a medida dos laços do silêncio, do invisível, refletindo o negrume do "não" em mim.

Minhas palavras desoladas tentar reconstruir a cintilância de tua presença numa química de real transmutação, mas esgotam-se as horas e sequer arranho o delicado prazer que teu ser dá.


No interior destas trevas que tua ida provoca, tento ser um deus para num clarão azul, vencer o tempo, transpor o movimento, criar o som até ter de novo junto às minhas tuas mãos.

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