Sou, sozinho,
em desamparo, sou assim qual um proscrito
Cheio das surdas vozes e a vida
corre como rio impetuoso
Não tenho morada, sigo a vagar
sem um refúgio a repousar
O cão ladra estridente, este
não é meu lugar, é da história
Silenciei minha voz com um soluço
aflitivo e estrangulado
Acordo nu,
só, meio ao pesadelo das batalhas contra o mal
No abandono vivo, que me remete
ao tempo que eu morria
Ora não posso mais sonhar que a
vida, num zéfiro da sorte
Viesse, no âmago do dia, redefinir
o depois, o além de tudo
Na ingênua
noção deste poeta sonhador, atordoado e cego
Em meio à ilusória placidez, a
solidão novamente se assoma
Aniquilando
as plagas da esperança, a irmã das primaveras
Consulto os astros no firmamento,
mas não acho respostas
Estão todos na mesma irracional,
fúnebre e austera mudez
Não há um botão que, mágico,
faça galhos secos em flores
Que faça do
ar quente, brisa fresca e dos fantasmas, heróis
Não vejo nas auras as cores
ideais, tão-só rumores remotos
Sinto que sou apenas uma alma
solitária no aquário da vida
Um homem primitivo perdido
entre tão pálidos crepúsculos
Que é um quase nada, alguém que
restou carente de unção
E no grave aspecto da noite, em
névoas densas e singulares
Que busca
alcançar a inatingíveis e fúlgidos altares surreais
Finalmente,
o dia anuncia que a luz já virá difusa e ingente
Hora de ser ardente e jovial e
buscar a força numa crença
Que dias melhores chegaram para
virar a vida inteiramente
O botão de rosa e suas pétalas gráceis
e sedosas,
multicores se abrem alegres no
ar como um ósculo mais breve.