quarta-feira, janeiro 17

Nas Asas da Poesia



Eu desejo voar contente para longe, nas invisíveis asas da poesia
Mesmo que, confusa, a mente se atrase estarei ainda tão decidido
Meus olhos um dia não serão como plúmbeas nuvens carregadas
A chover sobre meu rosto infectado de nubladas esperanças vãs
Num mundo frio, onde nas noites o ódio se cria a cada esquina
No coração insano que segue preso ao meu peito, ousará ser feliz
Não mais a vagar por entre mundos sem amor, de ira e de rancor
Mas rumo a um mundo de fantasia onde haja um tanto de magia
Onde não se triunfe da nossa aflição e no horizonte não haja dor

Fui um cavaleiro em armas a viajar pelo astral, vi agonias demais
Foram infindáveis lutas cheias de ira, de sangue, a ferver, remoer
Mas é fato que sobrevivi e já não cabe mais tanto rancor em mim
Para que minha existência siga, enfim, liberta de duros remorsos
Irão chegar ao fim os tempos do sofrimento estampado nas faces
É tempo de colheita e os esquilos se fartam de avelãs em sua toca
Encontrarei a dama dos campos. De cabelos loiros e passos leves
Ela irá me olhar docemente e dará suspiros como se já me amasse
Sei que minha vida necessita seguir adiante, tanto mais selvagem

Meu coração ébrio tanto já doeu em torpores de aflição que me vi
Absorvido pelo ópio nas sombras da massa de almas desgarradas
Tanto fugi do que realmente sou, do pecado de um triste passado
Ao aceitar meu destino, meu espírito se ergueu de mares revoltos
Saciei minha fome e a vontade de viver alastrou-se na minha alma
Não irei mais onde os sonhos jazem natimortos. Dissolvi, esqueci.
Vou degustar da flora e das verdes campinas. Dos frutos da vinha
Quero encontrar a linda boca vermelha para beijar. Então repousar
Por isso estou aqui, sou pássaro, descuidadamente, a cantar no céu

segunda-feira, janeiro 15

Rebeldia



Na linha do horizonte clamam pronomes mudos
Aprendi desde cedo os fundamentos da rebeldia
Nos volumes cinzentos da história de meus pais
A cada golpe fui desconsertando os dias difíceis
Até espalhar nos trigais qual último ato de amor
As mais remotas cinzas de quem partiu tão breve
Muito cedo arribou de nosso barco de esperança
Haverá quem me inquira, dos meus versos tristes
Ínscio quão é difícil ocultar no branco da camisa
O sangue derramado pelo frio do aço, no asfalto
Mas eu, com minha gravata e essa perfeita altivez
Fingi não olhar os escombros onde jaz meu amor
Ouço vivo as sirenes, mas não há o que agradecer
É tudo muito distante e a canção não tocou mais
Foi tanta morte para se carregar sobre os ombros
Que não sei mais o que meus sonhos anunciavam
Decido reagrupar meus trastes, espargir o medo
Prometer dar à minha vida outros nortes e rumos
Até este coração desabitado suspender a solidão
Pois a vida é um corredor onde não há regressos
A justiça não deverá ser só uma palavra no papel
Que se perdeu em mil novecentos e setenta e sete
Mas visto a calça de brim cerro os dentes e resisto
Faço destes versos a minha muralha, o meu abrigo
Perdoar a distância desse silêncio que ecoa em mim
Antes que a noite da vida venha, para me permitir
Tocar uma nova canção, já por tantas vezes adiada