segunda-feira, julho 27

Indiferença



Para alguns são só pássaros, uns enormes
Que passeiam desprendidos de instintos
Entre pessoas cotidianamente distraídas
No turbilhão de uma segunda feira qualquer
Nutrem-se dessas distrações assombradas
E lá se vai um atropelado no branco da manhã
Nem causa pânico, tornou costumeiro assim
É apenas mais uma ausência logo esquecida
Vagando insciente quando a rua ficar vazia
E sua alma que nem saberá o que a atingiu

Para mim, e meus olhos bastante atentos,
São vampiros de asas por demais negras
Revoando a serviço do mal na multidão
Os demais seguem indiferentes ao perigo
Que os sobrevoa em círculos estreitos
Para despertar o que há de pior por dentro
Que é a indiferença à dor que toca o outro
Nesse teatro moderno de virar o rosto
E nem querer ver, algo tão inocultável
De fazer-se solitário quase por ofício

Aos poucos distanciar-se vai sendo normal
Não só ao físico, mas abandonar a empatia
Os olhos riscam a irmandade do léxico
Pois importa o que vem atrás do umbigo
E na cidade fria, cada qual tem seu umbigo
Invulneráveis ao drama que não sentem
Espectadores sem expressão frente à vida
Que salvar-se apenas a si, é seu ideal
Se querem que me acostume ao novo normal
Deviam me resetar, recriando sem o coração

quinta-feira, julho 9

Velho Mundo


Quão longos são os caminhos que nos separam do velho mundo
Seu chamado vem do mar, na luz ansiosa da esperança anônima
Todos os faróis iluminam as estradas invisíveis no esquecimento
Dentro de mim tudo se move com paixão no urgente sonho azul
No céu, ao norte, estrelas deserdadas brilham num pulsar febril
E toda palavra, no coração do poema, aponta rumo ao ocidente
A terra dos ancestrais, habita dentro de nós mesmo em silêncio
De lá pertencemos e ainda renascidos, somos tão-só passageiros
Na noite tardia, mágicas memórias, são companheiras exultantes
Ave migratória que sou, busco retratar toda saudade no poema
E na disciplina dessa frágil caligrafia, lavo minha alma e coração
Na beira do mar a ácida névoa de cinza, a esconder o horizonte
Ao longe, cintila a folha branca de papel onde deitam os versos
A aragem varre os extraviados da noite nos portais da ausência
A fumaça se eleva em espiral do bule na mesa do café da manhã
Ouço a brisa pronunciando meu nome nas instâncias da memória
É o chamado dos antepassados que acende a chama da saudade
Que prepara este canto, enquanto o esquecimento não assoprar