quarta-feira, maio 31

Palavra Nova

A palavra procura o papel qual pássaro que atravessa

O céu do crepúsculo sem deixar canto e nem marcas

Já alcançou aquele sonho na velocidade da realidade

O futuro nada é mais que uma atitude do dia de hoje

 

A palavra se projeta qual flecha atirada ao horizonte

No hermético labirinto de cruas vias no espaço-tempo

Em sua intenção reveladora e indefectivelmente letal

Tocar no que apodrece, libar à força venenoso olhar

 

A palavra é quando crisálida e também é se mariposa

Qual a semente busca terra fértil e cai no chão árido

Já crestado de pedras pela incidência das desilusões

Mas brota coberta de um ontológico manto piedoso

 

A palavra descreve paisagens semânticas e vida viva

Ou que habite um falso reino raras vezes idealizável

De folhagem azul, desmoronada fonte de água pura

Ou outra beleza mal inventada no sol do amanhecer

 

Quando a palavra fala de amor, fala só o eco estético

A frágil andorinha na eterna busca d’um verão fugaz

Por vezes morre vencida pelo inverno em meio ao voo

E a arqueologia não registrará seus corpos náufragos

 

A palavra-verbo acabará tendo a sabedoria do amar

Despojada de toda convenção estúpida e servilismo

Muito mais sábia que a imagem corpórea ou analogia

Sem linguagem e de ora em diante tão só no coração

terça-feira, maio 30

Estação

No banco da estação numa tarde de sol a pino

Recosto-me na sombra macia das tuas palavras

Leio o livro que conta segredos em teus lábios

E sussurras carícias na língua em que me falas

Dialogas com o olhar, ébrio deixo que me leves

Bebo, pouco a pouco, as verdades inconfessas

no mar de tua boca que embriaga minhas mãos

Que murmuram ocultos vocábulos com o tato

No teu pequeno barco transportas meu alento

Diviso teu corpo sem mapa nas rotas do tempo

Já nem importa o rumo que este barco me leve

Vamos de sonho em sonho a buscar horizontes

Sob um céu onde o ar tépido enleia preguiçoso

E todos os pássaros vêm cantar com minha voz

Qual no dia que, nos ninhos, já não chove mais

Na esperança que tu os ouças nos meus lábios

Seguimos aliviados e ligeiros ao trem que passa

Transportados de ida e de volta, sem passagem

A fumaça do trem que parte apita viva e louca

Pelos trilhos que nos levam conhecer o infinito