quinta-feira, junho 30

Do Amor II

Queria dizer do amor que há em mim e me sobrepujou a razão
Pois, contemplo esta cama plena da tua presença destes dias
Dias anunciados de desejos indescritíveis, uno entre milhões
A profetizar o fim dos desencontros e a chegada de carícias
Um capricho do destino contra um mundo de probabilidades
Nos fizemos voar entre nuvens, longe das mazelas do mundo
Dançamos ao som de segredos, por pontes, túneis e estradas
Com o vento a nos agitar os cabelos, partilhamos aspirações
Paramos o tempo lá fora pela janela e até o trem já silenciou
Assim pudemos comemorar na tormenta, uma taça de vinho
E ouvir da voz cítrica da chuva histórias sobre a vida veloz
Saber que basta um pedaço demasiado pequeno de carinho
Para que possamos nos salvar das quedas de surtos infinitos
Um brilho cintilante que nomeei de meu relâmpago delirante
Que é o pássaro que do alto do voo avista as sombras de nós
A ouvir ígneos gritos e risos rasgados sobre o azul dos lençóis
Um coração que bate sem pudor de estar cada dia mais vivo
Asseguro-te que o amor nega as ausências e impossibilidades
O amor muda tudo de súbito se a vida caminha para a morte
O amor é o que nos diz que poderemos usar sapato branco
Ou roupa estampada mesmo que andemos à beira do abismo

quarta-feira, junho 29

Transparências

 A brisa acaricia o dorso da tarde de um verão tão peculiar
Persiste o silêncio profano e o pássaro se mantém pousado
Em memórias seculares, versos crus, o céu por testemunha
Na vida lá fora, um vírus assola as esperanças de viajantes
E assim vai se redigindo a história destes tempos modernos
Trilho por estradas fendidas embriagadas da água chovida
Vem a mim um turbilhão de imagens, entre misérias diárias
Notícias que escolho ignorar, feitas de indigesto negrume
O cotidiano é como um monstro acorrentado sem piedade
Nossas crenças sangram sob o cetim noturno, lua após lua
De mãos dadas buscamos um pouco outras transparências
Que a vida outorga a uns escolhidos ou as vemos no sonho
E, talvez, possamos desfraldar algum sorriso de emergência
Para apartar todos os enganos, as ilusões e as frustrações
Quando nosso olhar se cruza, brotam desvarios tão felizes
Surgindo em nossas faces, o rubor cristalino dessa certeza
Que o amor, no seu esplendor e pureza, nos salvará do mal

segunda-feira, junho 27

Aposta

 No silêncio da noite vem a sina dos amantes
Derramada num céu cor chumbo de tristeza
O tempo evanesce o que a memória guardou
Esse amor tão cristalino, amor de esperança
Eu apostei que viveria por toda a eternidade
Quiçá seja obra do destino e o amor morreu
Mas a noite adianta e a manhã vem vitoriosa
Abriga-me sob suas asas de um azul intocado
Ornado de duas nuvens brancas desgarradas
Ouço frases profundas que buscam consolar
Mas são só palavras despejadas dessas bocas
Essas palavras sem cor, da espera inesperada
Em troca do beijo tão cobiçado que não veio
Deitando o nome da bela amada, letra a letra
Nas palavras tocadas por razões improváveis
No frio do mármore a esperança desmantela
A poesia é amor deitado no desdém do papel
Onde se apostou pela vida, contra o destino
A última cartada contra a dor o azul vencerá