Certa vez tentei definir o amor que há em mim e me sobrepuja
a razão
Por todos os possíveis desencontros foi o arrepio de
uma breve carícia
Que sinalizou que algo indescritível estava por vir,
único entre milhões
Todo um estádio de contrassensos quebrados pelo capricho
do destino
Agora, contemplo esta cama plena da tua presença
destes últimos dias
Relembro que flutuamos entre nuvens distantes do mundo
de mazelas
Dançamos ao som dos segredos, cruzamos pontes, túneis
e montanhas
Partilhamos tantas aspirações debaixo do vento a nos
agitar os cabelos
Paramos o tempo, lá fora da janela, nos saudamos numa
taça de vinho
Ouvimos da voz cítrica da chuva mil histórias sobre a
brevidade da vida
Por fim, creio saber o que fez o amor: foi de muitos pequenos
pedaços
Provindos de infindos surtos e tantas quedas, dum
relâmpago delirante
Do pássaro que do alto de seu voo avistou a sombra de
cada um de nós
Sobre o azul destes lençóis; ouviu
ígneos gritos inauditos, risos rasgados
O coração bate sem pudor de estar se reinventando,
cada dia mais vivo
Sim posso assegurar: o amor nega
a ausência, a distância e o impossível
O amor surge como um desvio súbito no caminho da vida para
a morte
Nos seus dons está a receita que
nos diz quando usar sapatos brancos
E roupa estampada para caminhar caminhos floridos à
beira do abismo
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