Ainda esperamos que o verão nos
sopre no rosto rastro noturno da paixão
Como ficou
escrito em minha memória de tantos dezembros quase felizes
Se transporto em mim essa
vigília é que me dói como torneira aberta de fel
O porvir é um terreno sem dono ou
fronteira, onde rui uma casa destelhada
A mesa vazia e os olhos abandonados
daquela mulher de nome dissonante
Que já pouco
lhe importa se verões ou dezembros, meses são todos iguais
O silêncio denuncia minha
existência de fome e fúria nutrido de raízes vãs
A esperança amanheceu no corpo
sem fala como uma dor incógnita e nova
Esta dor
principia onde a agonia, num véu de cinza, se espalha sobre tudo
Tudo passa,
somos só passageiros abandonados que restamos esquecidos
O espelho do tempo põe-nos a
idade: uma porção de minutos no semblante
As eclusas
das horas serão apenas eternidades renascendo noites adentro
Eis aí os cacos de minha vida,
fragmentos do que foi visto, mas não vivido
Há tanto
tempo mantida suspensa à espera de alguém que não existia mais
A ternura permaneceu viva no
passado qual o vinho tinto que tinge a vida
E onde havia tanto de amor, em
um momento ruiu sobre o púrpura veludo
Fazer poesia é pensar palavras vindas
da alma, outras dormidas no coração
Todo amor um
dia vai conviver com a ausência intransferível das manhãs
Onde apenas um segredo sem cor reina
sobre o brilho de antigos perfumes
E as perdas nunca terminam nos
desvãos da alma, mistérios gris da solidão
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