Se escrever é fazer mágica, sou um mago; se for transformar, sou alquimista; se for dominar mistérios, então sou bruxo. Vim transmutar sentimentos em palavras e vice-versa. Os poemas falam de imagens, sentimentos e sonhos. Tudo se passa na vida real ou na surreal. Ao lê-los tenha atenção ao que está oculto nas entrelinhas. Deixe que os versos te levem onde o vento quiser levar. A musa de meus poemas é a vida. Estejam atentos, pois as palavras são metade de quem escreve e metade de quem lê.
quinta-feira, julho 31
terça-feira, julho 29
Desperdício
O sabor agridoce de teu beijo ainda recende na boca
Uma viagem, um enigma ou um fragmento do passado
Um olhar suplicante, sem cerimônia, invade os meus
Tal qual a luz de um farol que invade toda penumbra
São tantas sensações a inventariar e nada que baste
Nada que diga que não
fui, intimamente, o teu servo
Mas que também usufruí teu corpo sem desperdício
Sei que o esquecimento virá para
aplacar meu soluço
Os relógios cumprirão o mister a me tirar do espanto
Não aos passos solitários entre escombros,
mas seguir
Erodir os caminhos da vida até vencer todos abismos
Depois, fingir que é noite, e tu, ao meu lado na relva
Fitando estrelas que já não cabem apenas em um céu
Ouvindo a sinfonia que vem de um distante azul véu
Pois que sei que o vento levará consigo toda tristeza
A irromper no silêncio apagando profundos
lamentos
E na errância do dia venha a recitar ao pé d’ouvido
Este poema meu que é tão teu,
tal teu amor foi meu
Trono
O vento dos
tempos, inclemente, esculpe os rostos
Não há raízes possíveis que reconheçam
o eterno
E tu que do trono do deslumbre me viravas o rosto
A imaginar que não havia vida venerável fora de ti
Cresça! Nunca
nada foi teu. Percebestes os sinais?
A lua, o fogo crepitante, a alta solidão das estrelas
Crepúsculo irreal,
destinos alheios, presentes vãos
Apenas tu imaginaste e te falo não para que chores
Aquele solo de saxofone que
nem querias escutar
Em verdade não compus aos teus
ouvidos seletivos
A sombra
apenas me emprestara a música da noite
Tuas mãos já tão pálidas; onde eram rios,
são ruínas
Essa vontade
incontida de dormir, agora já o sabes
É o barqueiro que acerca-se e a moeda nas
mãos
Assim como o poema,
que já declamei não o fiz a ti
Tu partiste tantas vezes por obscuros caminhares
Mas de nada
adianta fugir, é só um outro caminho
Saibas que de onde se partiu, foi sempre a chegada
quinta-feira, julho 24
Antes de ir-se
À auroraPés descalçosQuem a morteJá derrotouOdor a alfazemaA guerraUm beijo na faceCondenadosTrinta dinheirosO leito sonhadoTremor na alcovaO que sucedeUma despedidaA mão que agarraMeia nádegaAntes de ir-se
Anoiteceu
Sob as sombras
dos tempos, a imagem mansa do mar
Devolve-me todas as lembranças que
guardei de ti
De tua pele desnuda rescendendo ao cheiro de sal
Dos teus olhos
assombrados dos tempos ancestrais
Daqui tão
longes, quando a alvorada afasta a noite
No chuvisco noturno débil e esquecido da história
O aroma dos lavandais recém cortados
invade o ar
No perfume brilhante recordo-te trêmula de prazer
E o teu torso,
opulento e macio, a respirar exausto
Num amor que juramos que jamais poderia terminar
Promessa ilusória, ceifada pela realidade da morte
Hoje é somente o mito ausente,
por trás da névoa
Ah, como me entreguei inteiro a essas recordações
Quedei-me indefeso perante a dor de toda distância
Os ruídos
cotidianos, a cidade irresgatável, estéril
Cicatriz corroída sob o
linho que cobre os altares
Vejo-te na minha alucinação à porta da
nossa casa
Vejo o sangue vertido no caminho,
sobre o asfalto
Ao meio dia
era sol, à uma, de dor o céu anoiteceu
À noite espero em silêncio, debalde, o teu retorno
quarta-feira, julho 16
Herança
O tempo depois de todo
o tempo, por incontáveis eras
Dos
séculos, das migrações, do vozerio à beira da água
Ainda
me quedo à tua espera, coberto do pó da estrada
Tal marca indelével, uma
cicatriz de vidas e de mortes
Velha procissão das
gentes em seus vestidos coloridos
Eis-me aqui, depois de
tudo, transmutado em essência
O sol nasce e se põe sem descanso, de tempos remotos
Crestando
o calcário, fendendo suas alvas porosidades
Sigo por teus
labirintos exercitando a minha pequenez
Na
brevidade de mais uma vida, ansiando deixar marcas
Nas paredes, nos pátios,
nos mais secretos cantos, a ti
Para
que me vejas, na minha transparência quase aérea
Chego
a este lugar, onde te espero desde todo o tempo
Nos
territórios de meu secreto reino, local de mistérios
Onde
emanam intocados, todos nossos primevos sonhos
Mas que percorro
solitário, aguardando a tua chegada
A fim de destecer as teias dos que nos querem afastar
E
por isso te chamo, sob a luz do sol que devora os dias
Teu
nome foi escrito no sangue a me percorrer as veias
No
quadro alegre da memória, ainda brincamos de viver
Entre
os muros que limitam mais uma curta existência
Na
vocação da espera o que meu peito sente incansável
Os
olhos negam sem indulgência à caprichosa esperança
Nesta
vigília que sei não virás e a dor é a única herança
Saga antiga
Um poeta esculpe pela noite os domínios do seu perfil
Percorre os
salões além das casas sem portas da morte
Sobe e desce entre
remotas ruas empinadas do centro
Corvo rubro do amanhecer, azul intenso que vem do
sol
E ainda que seja só um homem, não há o que o
defina
Sua alma finalmente liberta dos grilhões para onde irá
Último cárcere entre as brumas, último amalgama gris
Anjo remisso, quais marcos deixará antes da sua cova
Olha a fuligem
sobre as telhas, onde o musgo
prolifera
Nas gotas das chuvas que escorrem entre suas gretas
A que servem o estrume, os vermes, plantas e animais
Será o coração tão-só um músculo, não a casa do amor
Todo lugar é
apenas mais um lugar, uma outra canção
A vida é uma
viagem, um permanente desatar de laços
Minúscula gota de sangue, diluída no escuro da noite
Mas agora é noite e nas noites há que se beber o vinho
Hora de esquecer das
cinzas e, enfim, curar as mágoas
Como se pudesse, do
nada, ungir cada uma das feridas
quinta-feira, julho 10
Heróis
Olho a colina com minha melancólica alma ensanguentada
Estarão por toda parte os que me queiram mal nesta vida
É este o meu destino, enfrentar
tantos
punhais à espreita
A vida é 0 eco da morte, a borboleta exposta num
alfinete
Heróis silentes e imaginários que
se
desfazem em pedaços
São feridas abertas num jogo de mortalidade sem sedução
Humilhados ou arrogantes, todos derramam sangue e suor
Nesse redemoinho sem esplendores que chamam de viver
Observo os fatos irônicos, fertilizados por essa realidade
O não equilíbrio de quem encalça com serenidade o vazio
Que se iludem a imaginar serem os encantadores de feras
Avatares sombrios despedaçados, negando a imortalidade
O silêncio da noite nega a existência de um amor
gratuito
A busca do prazer, mas se encontra apenas impropérios
A paisagem desvanecida na penumbra é o que nos oferece
Corações prisioneiros no êxtase de seus peitos em chamas
Numa manifestação fortuita de toda realidade imprevista
Onde o tempo impreciso de sombras, escapava galopante
Montando em comoção espontânea, o cavalo dos sonhos
segunda-feira, julho 7
Pretexto
Não preciso de vãos pretextos para viver sem limites
Inobstante que meu coração lamente a tua ausência
Que tua figura tenha se perdido na fumaça dos dias
Chego a entender o desamor que limita certa gente
E tudo isso me faz escrever versos ao cair
da tarde
Ouço ao longe um acordeom, o fole arfando de dor
Ouço o pássaro, sinto a
brisa, os perfumes do verão
Certa vez construí um lugar contigo
e éramos livres
Mas veio a tormenta, enlouquecida a
deixaste entrar
Depois houve o nunca e a autora se perdeu na
noite
Hoje teu corpo é naufrágio e não posso te encontrar
Lágrimas que escoam, banhando teus lábios
de neon
Os dias correm velozes como nas
corredeiras do rio
Benditos os aventureiros que fomos,
sobreviventes
Desbravamos o grande labirinto, sem olhar para trás
Semeamos as sementes para reinarem quando árvores
Fomos avisados que não ficaríamos muito no paraíso
Assim escrevi um quadro, pintei um
poema inovador
Depois será o silêncio, um vibrante e
sonoro silêncio
De quem, ainda vivo e pleno, caminha entre os mortos
Rumando a outras terras, na luz tênue de um abraço
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