quarta-feira, julho 16

Saga antiga

Um poeta esculpe pela noite os domínios do seu perfil
Percorre os salões além das casas sem portas da morte
Sobe e desce entre remotas ruas empinadas do centro
Corvo rubro do amanhecer, azul intenso que vem do sol
E ainda que seja só um homem, não há o que o defina
Sua alma finalmente liberta dos grilhões para onde irá
Último cárcere entre as brumas, último amalgama gris
Anjo remisso, quais marcos deixará antes da sua cova
Olha a fuligem sobre as telhas, onde o musgo prolifera
Nas gotas das chuvas que escorrem entre suas gretas
A que servem o estrume, os vermes, plantas e animais
Será o coração tão-só um músculo, não a casa do amor
Todo lugar é apenas mais um lugar, uma outra canção
A vida é uma viagem, um permanente desatar de laços
Minúscula gota de sangue, diluída no escuro da noite
Mas agora é noite e nas noites há que se beber o vinho
Hora de esquecer das cinzas e, enfim, curar as mágoas
Como se pudesse, do nada, ungir cada uma das feridas

 


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