Trago em mim todas lembranças da cidade da infância
Agora que o verde das estepes é
apagado pelo outono
Ainda ouvimos, antes da noite, longe, o último lamento
Dos pássaros que reptam as planuras em
suas rasantes
Lá ecoa, alto nesta estação do ano, os rumores do mar
Onde o ar recende ao odor de madeira
e terra molhada
As luzes amarelas das casas nos dão a
sensação de vida
Erguemos a face ao céu para sentir onde troa o trovão
E sem vê-los sei que os lobos correm
pela noite sem luar
Lembro da namorada adolescente, não, nada foi em vão
De passear de mãos dadas por árvores floridas na praça
Será que essa inocência agora está
tão distante de nós?
Há quem diga foram vozes perdidas no ar do entardecer
E que em vão se perscruta o pó em busca de
algo antigo
O rouxinol, ao cantar ao pôr-do-sol, morto caiu do galho
Mas não eu não vejo assim, sei que os dias são preciosos
A última batida deste meu coração
ainda não foi ouvida
Os mortos não têm sede e tenho
em mim a sede de amar
The Writer Within the Wizard
Se escrever é fazer mágica, sou um mago; se for transformar, sou alquimista; se for dominar mistérios, então sou bruxo. Vim transmutar sentimentos em palavras e vice-versa. Os poemas falam de imagens, sentimentos e sonhos. Tudo se passa na vida real ou na surreal. Ao lê-los tenha atenção ao que está oculto nas entrelinhas. Deixe que os versos te levem onde o vento quiser levar. A musa de meus poemas é a vida. Estejam atentos, pois as palavras são metade de quem escreve e metade de quem lê.
segunda-feira, outubro 13
Rouxinol
Na pele da noite
Entre as
nuvens de gris, surge um singelo rasgo de azul
Qual a êxtase de uma flor sobre desertos de concreto
De ventos remotos que vêm a trazer ares de despedida
Nada depende de pretextos, de perguntas e respostas
O sol, alegria dos gestos, se derrama a causar novo dia
Os sentimentos confundem, ébrios de azul e cimento
Mas, há a quem
o céu nunca abriu ou a porta na terra
Lamento por quem só vê pântanos e a palidez do nada
Flores murchas, aves confusas e inertes nuvens cinzas
Essa voz soará errante, até que o tempo
se faça espaço
Na fiel lembrança de tempos
outros e em outras cores
Olho ao longe o éter do olvido a girar em redemoinhos
Breve a tarde
se fundirá na luz de loucos
pensamentos
E pensar que ainda pode haver paz no afã
destes dias
Que um dia aprendamos a viver livres e independentes
Que haja um lugar com amores sutis na seda da
derme
Onde todas feridas convalesçam, sem deixar cicatrizes
O paradoxo de
toda relatividade que cerca nossa
vida
É que só escolhemos o que nos parece mais importante
Tal a estrela que não existe, mas luze na pele da noite
Glória
Não escrevo poemas
para glória
O verso vive de
vestígios de amor
O mirante vive
à beira do abismo
O homem de
barro quer a altura
A
transparência num só impulso
Não quer
reconhecer os sinais
O segredo que
brande a espada
Em direção a
seu peito, se move
Restará uma
mancha de sangue
Na glória, a
palavra do vencedor
No amor, o que
pulsa na ferida
O amor é
lenda, a glória a queda
quarta-feira, outubro 1
Paradoxais Paroxítonas
O quadro vazioNos ensina o medoFalamos de claridadeMas somos sombrasSuplicantesMescladosRostos que vêmRostos que vãoSignos de mistérioVivemos a caçarMas somos a caçaDa noiteDo vinhoCruzo pontesMas queria o abismoLemos a sangue frioEscrevemos poesiaA mulher loiraSe inclinaPara cheirar a flor.
Raiz
Busco a raiz, a fonte geradora para um escrever
justo e novo
Qual será o moto real da força
vital que dizemos que é nossa
O que nos impulsiona e move todos dias quando nasce o sol
Lá fora, além da teia viva da cidade, sob o rigor geométrico
Luz e sombras transitam e iluminam meus versos renascidos
Eu, alheio aos ardis do dia, observo os precipícios
da noite
Ouço passos
femininos pela calçada, sob a janela do quarto
Um perfume
airoso a se espalhar incógnito com a penumbra
Quem será que
se aproxima pelo silencioso império noturno
Minhas mãos tateiam o fecho da janela e
sinto o frio metal
Tranço os dedos e uma visão se faz livre, breve e reticente
Ela vem pela rua, figura entre o transparente e o encantado
Um fulgor único a iluminar a selva de concreto à sua volta
Qual toda uma constelação que pousa diante de meu olhar
Um arco de luz que deixa seu rastro em meio a antiga
treva
Qual uma serpente em azul que, por espanto, se
dirige a mim
Sua branda voz ecoa na madrugada e
desperta a minha alma
Um singelo
cumprimento, breve e aceso qual um relâmpago
Meus olhos
fitam seu sorriso cristalino, lhe faço um aceno
Ela amplia o sorriso e a sigo com o olhar até virar a
esquina
Contudo é o que basta à revoada de minhas aves notívagas
Que partem céleres querendo chegar antes dos
raios de sol
Roman d'Amour Moderne
Ao longe um apeloGrito surdo abafadoQue persisteExpira,Espira,RespiraBusca o infinitoSeu leitoCoração da noiteAbrigoE o silêncioEnormeTenho fomeNão demoreTeus lábiosE essa noiteInsanas trevasComo conseguesConsciênciaConsistênciaCoincidênciaOlhe, podes irNa boca, da noite,eles se beijaramse amaram edisseram adeusSua vidasubitamenteseguiu quaseimperceptível
terça-feira, setembro 30
Aldebarã
Nos meus poemas,
descrevi-me qual pássaro que plana
Sobre as
árvores que propõem histórias sobre homens
Escrevi dos peixes e escamas coloridas que não tatuei
Da areia que construí castelos e um farol à beira-mar
Disse, não do que fiz, mas do que viram estas pupilas
Todos saídos de meus sonhos pelos caminhos da vida
Infinito sonho, oceano de imagens, meu autorretrato
Anotei palavras que não entendia para me entenderem
Voei sobre a selva e sob um céu entre nuvens, tão azul
Juro não foi por intenção, queria tão só ser criança
Que aprende a
ler e descobre um mundo nas palavras
Imaginando o que poderia existir acolá do horizonte
Volte a dormir, a voz me disse, mas eu queria
acordar
Descobrir a imensidão que há
na ponta desta caneta
Seguir cada rota errante, por as cartas sobre a mesa
Crer que nem o sacrifício ou a cicatriz sejam em vão
Que estes rabiscos deitados sobre a folha do destino
São o que me tornaram o pássaro em voo a Aldebarã
Apaixonado, meio
a ventos boreais, cantar o amanhã
E para afrontar
aos incrédulos, ainda, ousar ser feliz
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