A dor, esse amargo sumo que goteja e a terra não sorve
Não esconde os erros, não cala o que foi. Tanta lágrima
E o pó do barro continua pó, não faz rocha nem abraço
Não vence os muros, antes espanar as roupas e levantar
Abra os olhos, a rosa sem perfume é só plástico e arame
Flor que o verbo abandonou, morfema mero e tristonho
Esse verso emprestado que só se abre à vista da solidão
Porém se esconde detrás d’um belo par de íris de cristal
O asfalto apenas é uma estrada, porém não é o caminho
Uma porta entreaberta, bocas distantes e a mesma sede
Impassível, a saliva que o sol goteja no chão ao meio-dia
A água na geladeira, longe qual mãos em braços abertos
É bem mais fácil espernear-se que oferecer a outra face
É mais fácil subir no muro, olvidar o suor e sem lágrimas
Negar e disfarçar essa ausência de expressão nos lábios
A contrariar o senso da incandescente borboleta rubra
Que bate as asas de bordas negras num alarido noturno
Sem medo de, por isso, ver-se presa numa jaula de metal
Tomo da pena, escrevo a palavra e olho meio de soslaio
Afugento a borboleta, retomo meu voo ao véu noturno
De mãos crispadas, desenho uma janela e salto no vazio
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