Ele tinha o
rosto em silêncio como pedra viva
A boca fina e esquiva não trazia sorrisos fáceis
O cabelo era
fino e claro, cheirava a gomalina
Com a navalha
tinha a barba sempre bem-feita
Eu o achava tão alto quanto eu gostaria de ser
Quando sentava
no sofá, cachimbo e chinelos
O cachorro
deitava-lhe sobre os pés em ritual
O rádio de ondas curtas chiava e dava assobios
O locutor
falava espanhol e ele compenetrado
Ia decodificando o mundo, sorrindo enigmático
Vez ou outra
olhava para o vazio, onde estaria?
Não tive tempo
de compreendê-lo mais a fundo
Muitos anos passaram desde quando ele se foi
Quando eu
descobri o porquê de ouvir noticias
Também
descobri que o tempo não volta nunca
Tinha tanta
coisa que eu queria poder lhe dizer
Eu queria mostrar-lhe estes traços tão sumários
Cuja inspiração o teve como emblema silencioso
Queria ter
dito que o compreendo, mas é tarde
Só sobraram memórias a me assaltar o raciocínio
Que a vida é tão curta para tanto que há a saber
Não dos livros, das línguas ou das enciclopédias
Mas da própria
vida, misteriosa a cada esquina
A cada volta,
parecendo nos ensinar, a vida dá
Meu velho, deixo o que te devia desde sempre
O reconhecimento que a minha rebeldia inata
Nasceu foi de ti. As respostas um dia as terei.
Teria sido obra do acaso que ao escolher este assunto, ele tenha recebido a posição 60, por aqui?
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