Se escrever é fazer mágica, sou um mago; se for transformar, sou alquimista; se for dominar mistérios, então sou bruxo. Vim transmutar sentimentos em palavras e vice-versa. Os poemas falam de imagens, sentimentos e sonhos. Tudo se passa na vida real ou na surreal. Ao lê-los tenha atenção ao que está oculto nas entrelinhas. Deixe que os versos te levem onde o vento quiser levar. A musa de meus poemas é a vida. Estejam atentos, pois as palavras são metade de quem escreve e metade de quem lê.
segunda-feira, junho 16
terça-feira, junho 3
Contrapontos
A poesia por vezes é o triste oboé, outras o jovial trompete
O poema
exercita as sombras nesses sopros, no escuro véu
Tão seco e
plúmbeo, avaro de doçuras, em antigos lençóis
Será a morte laboriosa silenciosa num amargo céu de
junho
O verso não basta, amar é pouco, nesse galope desvairado
Somos uma
densa fábrica de tristezas nesse outono febril
E tudo que
resta é desterro, bordado de parcas memórias
Contudo se bem
olharmos o moinho da vida, veremos vida
Qual se não morrêssemos amanhã, não morreríamos jamais
Além dos trovões que nos assaltam nas noites de pesadelo
Se provermos
os ouvidos abertos virá um som de concerto
Com seus timbres que fazem vibrar os alicerces do silêncio
Mil lâmpadas se acenderão, tramando entre velhos
retratos
Pela volta da luz como nunca, em busca de claras memórias
Menos ácidas, entre tantas, nas
gavetas azuis do cotidiano
Enfim o poema
eclodirá, renascido no amor reencontrado
Nunca mais
seremos os mesmos a brilhar na luz do destino
domingo, junho 1
Sabedoria
Restou a saudade dos perfumes dos lilases dos anseios
Dos anos passados são tantos os amigos que já partiram
De crianças que brincavam ao redor dos pés de frutas
Ou de cada letra mal soletrada na palavra elucubração
O sussurro musical daquele rock que meu pai proibira
Foi então que descobri, ao acaso, o despertar do amor
E mesmo as cobras que inadvertidamente acariciamos
O vinho e o vento guardam as lembranças adormecidas
Muito além da encruzilhada onde enfim nos calaremos
Ainda que o inverno venha, e virá, inexorável e severo
Desterro
Onde ocorrem as circunstâncias daquilo que nunca vivi
Mas que sinto na minha carne, qual uma saudade porosa
Eu, o romântico concreto, incabido em notas didáticas
Vejo que o dia, entre o céu e o almoço, lambe o tempo
A boca vivente, dois ouvidos em meio ao silêncio abissal
Estendo as asas imprescindíveis para não deixar rastros
O que se houve compreendido já não existe neste chão
Um pássaro não confunde o vento em sua nua verdade
terça-feira, maio 27
Inspiração
Sim, bati à tua
portaBati, dia após dia, que
saibasUm caderno às mãosAté tê-las trêmulasPor mendigar tua vindaVezes que esperei em
vãoPorque faço assim?Sem esconder a angústiaTer um quê de vergonhaÉ por ainda te amarDoe-me tua avara ausênciaO tanto que me ignorasOh Poesia!Porque permitesA tal inspiraçãoFugir de mim?
quarta-feira, maio 21
Lírios da Noite
Neste final de maio, doce como lírios que brotem na noite
Sei que virás, sob essa luz lilás, tão breve quanto perfumes
Assim me transformei em sonhador da fonte de luz e vida
Quisera cantar no alto das montanhas, seguir os rouxinóis
E quão mais afasta, tão maior é a saudade que sinto de ti
Sob negra abóboda há o poema e uma justa causa a morrer
Qual lírios da noite, o consolo é sentir, onde vá, teu aroma
Vou recitar este poema, acompanhado do coro dos ventos
E onde houve silêncio o país inteiro há de ouvir minha voz
quinta-feira, maio 15
Noturno 7.0
Na vertigem do
tempo interior, nos perdemos sem saber o porquê
Os sentidos
desgarrados não concedem luz, não nos encontramos
Nos notamos incompletos, sem a consciência veloz do pensamento
E vamos embora pelo mundo, nos aproximando de múltiplas coisas
Mas nada é o real e, de completo, o que resta é
apenas o silêncio
Por vezes, parece que o real é um copo
de conhaque e um blues
E que miragens não são mais que um estágio elementar da
verdade
Restamos cada vez mais sós, ao abandonar o nosso voo de pássaro
Saímos pela porta dos fundos a sorrir, sem que ninguém
entenda
O que há de transfigurado nisso tudo, se
talvez murmurássemos
Se os fizéssemos pensar que somos justamente como o esperado
Então se
satisfariam se nos mostrássemos ser o grande
usurpado
É do que o
passar do tempo nos livra: da obrigação de ser normal
De corresponder à conduta rude de um tipo normalizado
de viver
Integrar a ficto-estabelecida
verdade é animar e povoar a solidão
Onde as sensações devam ser as pertinentes à consciência
geral
Olho os gerânios no jardim, já derramei muitas lágrimas
ao chão
Já sofri muitas feridas profundas, porém isso reside no passado
Aprendi que a plenitude está no eterno fluir de princípios
e fins
Ouso proteger-me num círculo invisível na minha imortal rebeldia
Onde ninguém me imponha aquilo o que devo entender por beleza
Mas que tudo seja o amálgama de noções que faz do carvão,
luz
Onde sei que, não sendo imortal, posso viver segundo a segundo
Desdobrar cada
coisa no melhor que dela eu possa vir a
conceber
Nem julgue que
este poeta escreva um poema sem falar do amor
Se de tudo que
há na vida é o amor o mais complexo sentimento
O amor não é a
chegada, é o caminho e assim terá começo e fim
Como as rosas que nascem, nos encantam e
perfumam e se vão
Mas nem por isso deixamos de querer rever sua peculiar beleza
Nem a roseira deixará
de ser roseira caso não se cubra de flores
Ah, dirão, o
amor é dor. Que o seja, sem amor e dor é só o vazio
O amor é luz
radiante, é o sonho, o fogo lento que nos consome
Não se olvide o sonho, razão além da razão, de haver o amanhã
O sonho é o fogo que acolhe nossos insucessos
e os transmuta
Que se subleva aos furacões e deles faz a brisa que sopra lenta
O sonho é seiva a animar a planta, antes do primeiro raio de sol
De sonho, inconformismo, amor e rebeldia se vão setenta anos
Os quais não nego, mas não os carrego como um pesado fardo
Ainda guardo no peito pequenas ilusões, como frutos maduros
Ergo o cálice, onde não cabem lamentos, apenas rubros taninos
domingo, maio 11
Obstinado
Um pássaro esquivo cruza os ares gris do crepúsculo
Ouço seu canto que vem sul, ave fugitiva do inverno
Busca o sol d’outras latitudes, que regresse sua
luz
Onde habitaria,
hipotética calidez, a pulsar na manhã
A algidez deste vasto outono que, precário, perdura
Chega a
tormenta, o chão crestado vibra em segredo
Oculto do inimigo, versos íntimos quais favos de mel
Que guardei para ti, sob a amena
sombra do choupo
Entre o silêncio cotidiano, invento a palavra
mais crua
Sortilégios do destino, nas entrelinhas, a verdade nua
De raízes
profundas, oculta sob a poeira dos
séculos
Dissidente da perversa desmemória clama ser e estar
Os pássaros já não gorjeiam por esta tão imensa terra
Emudecidos de pavor e espanto, queimou o arvoredo
As mãos são
palma e carícia ou serão punho cerrado
Se o poema fere, ao certo não sangra o peito ferido
Obstinadamente elevo a voz em cada pedaço de mim
Ilumina-se meu
pensamento arde, crepita, se inflama
quarta-feira, maio 7
Selvagem
Encontram-se e partem entremeados de desejo e fugacidade
Línguas que não se indagam e bocas que não se questionam
Apenas se buscam e se encontram, no vai e vem dos quadris
A luxúria ancorada sem palavras, que não pede explicações
No tato da noite, na ponta dos dedos ele ofereceu o enigma
No tato da noite, na ponta dos dedos ele ofereceu o enigma
Nos mistérios da carne, ela acolheu os desafios a desvendar
Sentimentos atemporais, brevemente esconderão a nostalgia
Após um tempo sem início ou fim, convocaram o amanhecer
Do silêncio na noite, de corpos selvagens cheirando a jasmim
terça-feira, abril 29
Amanhã
Nestas horas sonolentas da noite, cobra-me o tiquetaquear desse relógio
Vir o sono, eivado de solidão e amontoado de minutos ocos e horas vazias
Mas ao invés de dormir tomo a rédea de seres alados, rumo às distâncias
Amanhã cobrar-me-á o despertador que tenha salvo no sonho a esperança
Tu a quem Morfeu cerra os olhos e não imagina o vento etérico que sopra
Como um açoite encolerizado, troando entre o criado mudo e a cabeceira
Antes que o ouro solar irrompa pelas frestas da tua janela tenha atenção!
Que não te acorde o frenesi embriagante das areias de um tempo mágico
Que te clamará a presença por lugares tão familiares quão desconhecidos
Os quadros à tua volta abrirão caminhos para que por eles, curioso, sigas
Por entre as tintas de paisagens amarelecidas desses outonos imaginários
Onde do cimo da sela se ouve verbalizar os gritos amordaçados da utopia
E creia, é tudo real. Mas só o musgo da sabedoria acalmará essas dúvidas
Em meio à morna madorra viajarás se não te magoares com tanta arritmia
O tempo é um eco do tempo e díspar daquele tão milimétrico que admites
Em meus sonhos a noite acontece numa exata proporção de luz e sombra
E assim é que o poema se cria, sem ressalva ou impaciência, já pela manhã
Tudo mais, retas e curvas, residem na promessa viva de uma nova estrofe
Não olvides, mais que vocábulo e verso é a entrelinha que toca ao coração
quinta-feira, abril 24
Irremediavelmente
Vejo-te tal o pássaro lascivo, que se aventurou na minha pele
Estrela despontada num céu de sonho, abrasada pelo querer
Que me beija, como se beija o fruto da doçura dos mistérios
E nos momentos de quietude povoa meu corpo até se saciar
E é assim que tua lembrança floresce no meu mundo surreal
Tatuando-me em segredo os signos onde pretendes me levar
Enquanto ainda ecoam pela casa, entre sussurros de prazer
Dias que perfazem em enigmas à espera de entregas de amor
Quando este, insensível, ousa me dizer que é hora de partir
quarta-feira, abril 16
Rosa dos Ventos
Esse suceder de estações, antigos passos pela escada
Debaixo da lua de um abril onde floresçam os trigais
Derramado na calçada ao pé dos sonhos irrealizados
A rua brilha na chuva debaixo de luminárias amarelas
Retrato num epitalâmio o amor das ondas e as areias
Na boca da noite, cintila a celebração dos contrários
Lavrando essências de esperança, liberdade e olvido
Ah, essa minha mania de amar-te viva, porém és lenda
Para amar-te criança pela loura mirada do horizonte
Eternamente amar-te em silêncio qual fosse um deus
segunda-feira, abril 14
Despedida
Algo tal o que fica entre as lembranças e as cinzas
Que são fruto do medo de sobreviver ao abandono
E afeiçoarmos à solidão quando morta no coração
Toda a ilusão e não mais sonhar, apenas adormecer
Tão pior quando atinge a mão que empunha a pena
Que se faz sossego, não mais o ponto de resistência
Mas se torna parecida com o que sempre combateu
Nossos últimos arrependimentos, o poço profundo
Dores que não revelo, pelos caminhos desse mundo
Viro a próxima página ainda é sonho, o novo poema
As lágrimas caem do céu, da sombra azul do abismo
O sol que nasce na amplidão e ergue o véu da noite
A noite antiga se desfaz no delírio em cor de ouro
E o dia afasta as sombras na reafirmação do tempo
O amor que ela rejeita e que breve olvida a dança
Recolhe asas, segue tropego por caminhos ásperos
De súbito os corpos passam a correr; é o recomeço
Tem início no grande drama, a voz obliqua na boca
O trigo cresce nesta lenda, a disputa de contrários
O sonho frágil, a fábula compõe parte da realidade
O sábio lê o poema, então segue leve qual a nuvem
quarta-feira, abril 9
Chão de Barro
Desd’aquela velha casa de tijolos, de chão de barro
Ali debaixo do teto nas travessas de madeira nobre
Sopravam vozes do vento, me ensinando a alucinação
De caminhar sempre em frente por todos caminhos
Dentro e fora dos sonhos perfumados como jasmins
Amar me ensinou o sentimento que ilumina a noite
Mas, ensinou também que o céu é a ilusão em azul
Fui assim descobrir o amargo da lágrima na distância
Na música tocada nas tardes, ao ranger da carroça
Velhas e lentas rodas, a circular tal qual o destino
Que faz escolher o caminho, não se sabe o porquê
terça-feira, abril 8
Venta Vento
De caligrafia e voz frágeis vivi a dúvida sobre minha arte
Sem, todavia, permitir a sombra se apossar de minh’alma
Assim poder falar às cinco da tarde de fome e de desejo
Para ser violino, contudo soar muito mais como um oboé
Rebelar-se contra a tristeza qual um trem desgovernado
Espalhar arpejos iluminados por lembrar do amor que foi
E no litígio dos dias desaprender a odiar, é de novo abril
Não temer, prematuramente, pelo inferno ou um abismo
No final do caminho que antes caminhava olhando o céu
Nada se avista o que já ruiu detrás da névoa de outono
Na capa do poema onde teu nome, dourado, ainda vibra
quarta-feira, abril 2
Inodora
Ah,
essa solidão que é feita de toda tua ausência
Um território irreversível toda vez que não estás
Que se cria quando a razão se faz de sentimento
Para delinear o contorno da realidade e do sonho
Esse purgatório que se gera em céus sem estrelas
Adoraria que os relógios parassem na madrugada
Antes que meu coração sangre na tua despedida
Que pudesses te render às armas do meu silêncio
Do meu olhar inundado que dispensa as palavras
Para assim me permitires de novo te enlouquecer
Queria alcançar a razão indecifrável de tuas idas
Abdicando da conveniência em favor da verdade
O porquê te vais se tua boca inda busca a minha
Se trazemos à tona, animal liberto, todo esse cio
Que nenhum labirinto de cimento pode esconder
Só o poema amainará a sina febril dessa ausência
Essa dor necessária, rosa inodora, pétala sem cor